O filme “Ladrões de Bicicleta”,
produzido em 1948 pelo italiano Vittorio De Sica é um dos filmes mais
consagrados desse movimento. O filme retrata a história de Antonio Ricci
(Lamberto Maggiorani), um homem humilde que luta para sustentar sua família.
Após ter seu único meio de locomoção roubado, uma bicicleta, Antonio e seu
filho saem pela cidade à procura do objeto furtado.
No Brasil esta vanguarda eclodiu
em 1953 com o Alex Viany, com o filme “Agulha no Palheiro”, e sobretudo, com
Nelson Pereira dos Santos com “Rio 40 Graus” (1955) e “Rio Zona Norte” (1957).
No cenário local, somos bem
representados. O jornalista e diretor-roteirista Eloi Pires Ferreira trouxe
para Curitiba o prêmio Margarida de Prata, pelo longa-metragem “Sal da Terra”
produzido em 2008. O filme conta a história de um padre caminhoneiro que por
meio da estrada descobre personagens marcantes e a diversidade humana. Pelos
quilômetros rodados o padre pretende ajudar cada personagem que passa pelo seu
caminho tendo como ponto final de sua viajem a celebração da Santa Missa.
Em entrevista, Eloi Pires
Ferreira nos conta como descobriu sua paixão por cinema, um pouco mais sobre a
produção de seus longas e também sobre o futuro do cenário local curitibano.
Como você descobriu sua paixão
pelo cinema?
Indo ao cinema. E muito cedo. O primeiro filme que vi (no colo dos meus
pais) eu tinha menos de dois anos. Foi no antigo Cine Guarani, no Portão, era
um filme alemão que eu não lembro mais o nome e segundo minha mãe eu fiquei
muito entusiasmado principalmente com os trailers e curtas que passavam antes
do filme. De lá pra cá eu nunca mais parei de ver filmes.
Quando decidiu focar suas obras
na vanguarda neo-realista?
Eu não decidi assim calculadamente e nem sei se é bem isso. Os filmes
que eu fiz têm influência neo-realista, sem dúvida, mas também outras. Acho que
o primeiro filme neo-realista que eu vi foi "Ladrões de Bicicleta",
do Vittorio De Sica, pelo qual me apaixonei no ato. No "Curitiba Zero
Grau", os personagens pai e filho catadores de papel remetem diretamente
ao pai e ao filho do "Ladrões". Mas também aquela relação pai e filho
lembra a relação pai e filhos de "Vidas Secas" do Nelson Pereira dos
Santos (outro dos meus filmes preferidos de todos os tempos) e a minha própria
relação com meu pai quando eu era criança. Mas minha preferência é antes de
tudo por personagens. De resto as coisas vão acontecendo.
Fale um pouco da experiência e as
dificuldades de fazer o longa Sal da Terra, filme que ganhou o prêmio Margarida
de Prata. Qual a importância desse prêmio para sua carreira e para o longa?
Fazer o "O Sal da Terra" foi antes de tudo uma grande
aventura. É um filme estradeiro, portanto, de produção muito complicada. Eu
sempre digo que filmar na estrada é insalubre, tinha que ter "adicional de
periculosidade". Foram nove semanas de filmagens entre 2003 e 2004. Aí o
dinheiro acabou e só conseguimos terminar e lançar o filme em 2008. Foi um
projeto que exigiu muita garra de todos os envolvidos na produção, sendo que a
maior dedicação veio da parte do meu principal sócio no projeto e também um dos
roteiristas, o J.Olimpio (já falecido), que se mostrou um valoroso guerreiro. O
filme trata de temas que me são caros e fala da condição humana pelo viés da
espiritualidade. Teve uma trajetória interessante e além do Margarida recebeu
também o prêmio de melhor longa de ficção no "European Spiritual Film
Festival", realizado em Paris, em 2010. Sim, ganhar algum prêmio é sempre
muito bom, massageia um pouco o ego e é uma forma de reconhecimento, fazendo
você acreditar que toda aquela trabalheira e seu resultado, enfim, tudo aquilo
não foi algo completamente inútil. E no caso do Margarida de Prata, ele é um
prêmio antigo e reconhecido no meio cinematográfico brasileiro e a gente tá
muito bem acompanhado, já que vários filmes importantes da nossa cinematografia
foram agraciados com ele ("Central do Brasil", entre outros). Mas
tirante o Oscar e, num segundo lugar bem distante, a Palma de Ouro, o público
em geral, que é quem pretendemos atingir com os filmes, não tá nem aí, não tem
a menor ideia do que sejam os outros prêmios.
Como surgiu a ideia para o filme
Curitiba Zero Grau? Muitos aspectos neo-realistas estão presentes no filme,
você poderia me falar sobre as técnicas de produção e as dificuldades?
São várias ideias que foram se somando. Mas, basicamente, tudo vem da
observação do cotidiano, da vida do cidadão comum, das pessoas que nos cercam,
do que aparece no noticiário e das minhas próprias vivências e das pessoas
próximas a mim. Isso também se aplica aos outros dois roteiristas, o Altenir
Silva e o Erico Beduschi. Como mencionei acima, o filme tem propositalmente
elementos que remetem ao neo-realismo, guardadas as diferenças de tempo, meios
de realização e opções estéticas. Quanto às dificuldades, eu havia dito que
filmar na estrada é insalubre, mas filmar nas ruas de uma grande cidade não é
diferente. O "Zero" também levou em torno de 8 a 9 semanas de
filmagens, com muitas locações, sendo a maioria externas, muitos atores e
figurantes, além de uma equipe bastante grande (para os nossos padrões fora do
eixo), equipamento pesado (rodamos em película), variações climáticas etc.
Então dá pra imaginar o grau, não é?! Sugiro que vocês assistam ao making of que
está nos extras do DVD.
Quais são seus projetos futuros?
Mais de uma dezena, sendo 3 longas de ficção, 3 documentários e vários
seriados pra TV. Tudo em projeto, por enquanto. Alguns em fase de captação de
recursos, outros aguardando resultado de editais e todos com roteiros prontos.
Como você vê o momento atual do
cinema brasileiro? E o cenário local curitibano?
O audiovisual brasileiro está num momento superinteressante, com muitos
mecanismos de financiamento de produção amadurecendo, muitas oportunidades de
negócio, a profissionalização avançando, mas com alguns velhos gargalos. As
estruturas de distribuição e exibição nas mãos das majors norte americanas e a
concentração dos recursos ainda no eixo Rio- São Paulo, e tendo o Rio
praticamente como único cenário (o que eu tenho chamado de riocentrismo),
apesar de o nosso Brasil ser tão diverso. Mesmo assim, dá pra dizer que a
regionalização está em processo, com alguns avanços bem evidentes. Saindo do
eixo, Curitiba está numa posição bacana, mas podia ser melhor, principalmente
se os curitibanos gostassem um pouco mais do que se faz aqui, como acontece com
Porto Alegre, Recife, Fortaleza...
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